John Lennon é uma personalidade importantíssima em minha vida. Poucas biografias, talvez nenhuma outra, tenham me custado tanto tempo. Realmente me dediquei a leituras, ver filmes e ouvir discos do cara. Conheço razoavelmente a vida e a obra de Lennon.
Um de seus textos de maior impacto sobre mim é a letra de God ( confira AQUI ). A sequência final de itens nos quais Lennon declara não acreditar é um soco na boca do estômago. A sinceridade ao vaticinar o fim do sonho de uma geração é cortante. Esse niilismo molda um bom tanto de minha visão de mundo.
Por isso que acho tão bonita a existência de quem acredita. Pessoas que levantam da cama com fé. Dizem que as coisas vão melhorar. Esbanjam otimismo. Only good vibes. Se esse país fosse justo, gente assim receberia 50 reais do governo todos os dias. Só para manter esse alto astral.
Eu não estaria entre os beneficiados desse programa social. Minha descrença é tanta que provavelmente seria sobretaxado. A pessoa vem me mostrar o azul do céu e dizer que as coisas vão melhorar. Ouço e concordo. Não gosto de ficar colocando água no chope alheio. Mas a realidade vem e é cruel. E nos esbofeteia diariamente. O otimista enxerga nisso um estímulo. Eu, um martírio.
Veja só a torcida do Fluminense. Parcela significativa dos tricolores do Rio de Janeiro estão em êxtase com a chegada de Paulo Henrique Ganso nas Laranjeiras. Estão o comparando, veja só você, a Assis. É preciso muita fé para acreditar que o atleta revelado no Santos, que um dia foi apontado como sucessor de Zico no futebol brasileiro e até mesmo com mais bola que Neymar, vá brilhar novamente. Ganso nos últimos anos é um acúmulo de fiascos.
O blog O Mundo é uma Bola da Folha de São Paulo, escrito por Luís Curro, traz números. Nos últimos 30 meses, só esteve em campo 45 vezes. Jogou os 90 minutos completos apenas em nove ocasiões. A média nesse período é de 42 minutos por partida. Há mais de um ano não balança a rede.
Só mesmo a fé para explicar a esperança de que Ganso fará diferente no Fluminense.
Outro caso explícito de fé contra as evidências é o encantamento de parte da opinião pública brasileira pelo vice-presidente Hamilton Mourão. A última do general foi afirmar que o aborto deve ser decidido pessoalmente pela mulher, não uma questão de Estado (confira AQUI ). Concordo. E quase a totalidade da esquerda brasileira também.
São tantas declarações ponderadas de Mourão, tantos posicionamentos compreendidos como de esquerda que, daqui a pouco, ele aparece na Marcha da Maconha.
O problema é acreditar que o general, esse mesmo que já disse que embranquecer a raça é positivo, que o décimo terceiro é uma jabuticaba, elogiou o deplorável Ustra, enfraqueceu a transparência pública numa canetada, é um progressista convicto.
Tem que ter muita fé para crer que, em tão pouco tempo, Mourão migrou de um reacionário completo para um liberal nos costumes de verdade.
Vejo tudo isso e só me recordo de Lennon: eu só acredito em mim, na Yoko e em mim. Impossível discordar.