OpiniãoOQRTendência Pablo Kossa

Você ainda está em 2019? Eu não

20 de dezembro de 2019 Nenhum Comentário

Preciso ser sincero com você, nobre leitor: estou me arrastando para fechar esse boteco sujo chamado 2019. Os copos estão jogados na pia, o banheiro está imprestável. E ainda temos uma duas semanas para segurar as pontas.

Não consigo me concentrar para terminar os trabalhos que ainda precisam ser finalizados. Tenho dificuldade em focar no operacional das festas familiares de final de ano. Estou com preguiça de comparecer às confraternizações mil que o convívio social nos impõe. Tá foda!

Mas a gente é brasileiro e não desiste nunca. Nosso povo sabe que o fundo do poço é uma ilusão: lá embaixo sempre existe um alçapão. E temos um talento internacionalmente reconhecido para afundar mais. Não se desespere com o tombo de hoje, pois certamente o de amanhã será pior. Mesmo com a consciência que 2020 deve ser esse fiasco tipicamente tupiniquim, a gente ainda espera que algo melhore. Bobinhos que somos.

Bobinho que sou, estou imbuído nesse espírito. “Feliz 2020!”, “Agora as coisas vão melhorar!”, “Esse ano saio do vermelho no cheque especial”. Ouço, mesmo com tamanha distância, sua gargalhada me chamando de trouxa. Concordo com você, caro leitor.

As porradas desse ano que dá seus últimos suspiros foram tantas que nos deixaram com o couro grosso. O cinismo foi nossa arma para transpor esse corredor polonês chamado 2019. Andamos em cima da brasa, levamos cacetadas nas canelas, nos socaram impetuosamente nos rins, levamos petelecos nas orelhas, mas cá estamos. Pode vir quente, 2020, que a gente está fervendo.

Sempre prontos para a próxima, sempre esperançosos do futuro melhor que nunca chega. Estamos sem os dois dentes da frente devido aos murros na cara que levamos do ano que termina. Banguelas, na geral do antigo Maracanã vendo o Flamengo de Jorge Jesus jogar. Sorrindo, desdentados, com olho roxo e, veja só você, ainda sorrindo de esperança. Quem tem Bruno Henrique no ataque tem tudo. Essa esperança boba no amanhã. Minha ansiedade para o ano que vem parte meio que daí.

Que nossa vida melhore. Que a gente consiga prosperar. Que os números de DDDs esquisitos parem de nos ligar cobrando dívidas. Que o vizinho limpe a calha do seu telhado e as muriçocas parem de infernizar nosso sono. Que um chocolate da lojinha de Flávio Bolsonaro chegue em nossas mãos, afinal, fomos nós que pagamos.

Nada disso vai acontecer e você sabe do mesmo tanto que eu. Mas a gente precisa desse doping de otimismo para continuar. Bola pra frente, meu velho, bola pra frente.

 

Pablo Kossa é jornalista, produtor cultural e mestre em comunicação pela Universidade Federal de Goiás

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